A Rotina Cruel e a Expectativa de Vida dos Mangakás Atrás de cada capítulo novo existe um ser humano fazendo sacrifícios

Bolinhodearroz
Anime United
©Anime United

Recentemente um usuário do Twitter trouxe à tona um assunto que muitos imaginavam, mas poucos dão tanta importância: a expectativa de vida de mangakás. O usuário @niho_ame postou recentemente em sua conta as informações encontradas a partir de sua pesquisa, que iniciou após a trágica morte de Akira Toriyama, e os resultados são ainda mais tristes do que podemos pensar.

Segundo Niho Ame, a partir das listas adquiridas em um blog japonês e com exceção daqueles autores que morreram de tragédias e acidentes, a média de vida de um mangaká gira em torno de 62,6 anos, 20 anos a menos do que um japonês médio vive. Foram reunidos os dados de nascimento e morte de 219 mangakás para chegar a essa infeliz descoberta, o que traz à tona uma importante discussão sobre a qualidade de vida dos mangakás e todos os sacrifícios que precisam fazer para entregar histórias no prazo, além do intenso estresse sofrido tanto pelas empresas, quanto pelos fãs e as rotinas desgastantes.

Tabelas yaraon blog
©yaraon blog

Isso porque estamos falando daqueles que conseguiram destaque o suficiente para viver disso, porque, apenas no Japão, existem milhares de mangakás que correm sempre atrás de publicar sua história semanal para não perder a audiência e acabar esquecidos. O ritmo de publicação semanal é tão desgastante que esses artistas precisam trabalhar mais de 15 horas por dia, de segunda a domingo, podendo parar apenas para comer e dormir (Mesmo aqueles que possuem assistentes).

Quando voltamos para as publicações de Niho Ame, em seu Twitter, ele destaca que as mortes prematuras na faixa dos 30 e 40 anos podem ser classificadas como um verdadeiro “massacre”, pois ao fazer todos os sacrifícios, esses profissionais perdem 20 anos de sua vida. Inclusive, o próprio traz uma página de mangá com o famoso Osamu Tezuka (considerado o pai do mangá moderno, artista de histórias como Astro Boy e Dororo, além de fonte de inspiração para muitos grandes autores atualmente) comentando com um colega sobre não conseguir dormir, ao passo que um terceiro entra chamando a atenção de que ambos haviam morrido jovens.

Publicação yaraon blog
©yaraon blog

Obviamente existem exceções nessa triste lista, como: Shigeru Mizuki (GeGeGe no Kitaro), que faleceu aos 93 anos, Leiji Matsumoto (Captain Harlock e Galaxy Express 999), aos 85 anos e Takao Saito (Golgo 13), aos 84 anos. Ainda assim, o que nos leva a pensar sobre isso seria, talvez, as suas gerações que acompanharam uma indústria menos competitiva e menos exploratória quanto ao seu ritmo de trabalho. A criação de revistas como a Weekly Shōnen Jump podem ter influenciado muito essa questão, afinal elas têm um prazo de publicação muito apertado e também uma abrangência de público imensa, em que ao mesmo tempo que ajuda esses artistas a viverem de sua arte, também serve como catalisador da sua vida caótica.

A indústria dos mangás e dos animes seguiram evoluindo junto com a sociedade, mas isso não significa que seja tudo melhor do que antes. Por se ter esse grande alcance, a a demanda e a pressão por mais produtividade também aumenta significativamente, sem contar que o público vem ficando cada vez menos compreensivo e paciente com os capítulos e, assim, os mangakás sofrem desde ataques agressivos com inúmeros xingamentos na Internet, até ameaças de morte, correndo inúmeros riscos apenas por um ou dois capítulos ruins.

Mangaká
©Mangaká

Mas não se enganem ao pensarem que essa pressão parte apenas do público, pois a máquina trabalha através de ambos os lados. Os fãs realmente fazem parte dessa parcela na pressão por novos capítulos toda semana e de qualidade, mas quem alimentou essa prática foram as próprias empresas que só pensam no faturamento e, por isso, quanto mais capítulos disponíveis em menos tempo, melhor. Essa rotina exaustiva é o que vem matando os artistas aos poucos e que, para além dos mangás, também exaure as equipes dos estúdios de animação que compartilham desse mesmo ritmo abusivo de trabalho para suprir as expectativas e exigências do público e das empresas.

Não podemos nos esquecer de Yoshihiro Togashi que é um reflexo dos resultados dessa rotina desumana. Hoje vivemos esperando migalhas de novos capítulos de Hunter x Hunter porque o seu autor sofre de uma doença severa que o impede de ficar em determinadas posições e isso atrapalha o desenvolvimento de sua história, mas a grande vantagem de ser um artista renomado e amado por todos é que, tanto a Shounen Jump, quanto seus fãs, já expressaram sua solidariedade e não ficam cobrando ele e pressionando por novos capítulos. Existe um consenso geral de que só devemos esperar o tempo e as condições de Togashi para que a história consiga prosseguir, no entanto essa é uma esperança que apenas os fãs mais persistentes alimentam.

Mangaká
©Mangaká

Enfim, se vocês pesquisarem a quantidade de autores que faleceram antes de terminarem suas obras, se espantarão com a frequência em que eles sucumbem por doenças fatais. A ironia de tudo isso é que essa reflexão de uma jornada de trabalho desumana na indústria dos mangás e animes no Japão é mais presente no nosso ponto de vista ocidental, pois os japoneses possuem essa rotina exaustiva em vários segmentos de trabalho. O que não deixa de ser ainda mais agravante para o lado dos mangakás, pois como já falei: eles vivem para trabalhar e a pressão por conteúdo no prazo e de qualidade vem não só das empresas, mas também daqueles que se dizem seus fãs e não aceitam atrasos ou quedas no desenvolvimento. 

Vamos, então, finalizar por aqui nossa pequena reflexão sobre o que essa triste morte de Akira Toriyama traz à tona para todos nós. Infelizmente foi por uma fatalidade que não se pode controlar, mas quantos outros também não sucumbiram por razões semelhantes? É mesmo de se refletir.

Mangaká
©Mangaká

Agora deixem aqui embaixo suas opiniões e também suas próprias homenagens para o saudoso Akira Toriyama que nos deixou tão repentinamente, mas nunca deixará de nos inspirar e fazer parte da infância e da vida de muitos de nós.


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