A Guerra Cultural aos Animes e Mangás – Parte 3 A avalanche da mídia asiática

Josué Fraga Costa
(Redator)
Anime United
©Anime United

Antes de mais nada, só queria agradecer imensamente a todos que me apoiaram nesta fase da vida, completo com esta matéria um ano de Anime United, e que venham mais matérias por aqui, agradeço sua visualização e seu comentário em todas estas matérias até aqui! Este material é feito de fã para fã!

Anime United
©Anime United

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A Genialidade em Vender o Produto

Chainsaw Man
©Chainsaw Man

Se tem algo que está passando desapercebido por muitos nesta guerra cultural que estamos a ver nos últimos anos em relação aos conteúdos gerados por asiáticos, é simplesmente o oceano que separa a quantidade e qualidade de seus produtos em relação aos que são daqui por uma vantagem simplesmente ridícula, e não à toa querem cancelá-los. Eu falei em textos anteriores desta série especial, principalmente no primeiro, que nunca esperava ver as animações japonesas dominarem o mercado como está sendo hoje, ainda mais se você me fizesse esta pergunta lá em 2004 aos meus sete anos. E cá estamos em 2023 vendo mais animações sendo dubladas para nós do Brasil, mais mangás estão sendo trazidos oficialmente e a preços mais acessíveis, e não venha me falar que trinta ou cinquenta reais são valores absurdos, quando eu era criança, sequer tinham muitos disponíveis e era bem mais caros. E isto está acontecendo bem como em todo o Ocidente, e como isto ocorreu? Simples, quando assistíamos as animações, filmes e séries, simplesmente optávamos por nos divertir com as estórias das mais variadas, e não receber doses cavalares de militância política e panfletarismo identitário barato, que convenhamos, já saturou.

Mangás
©Prime Cursos

Aos tantos os asiáticos foram disponibilizando para nós uma concorrência forte e maciça no âmbito na mídia, os animes deixaram de ser apenas uma sobra da programação, para se tornarem os favoritos e mais vistos do ramo de animação. Os doramas aos poucos estão permeando no imaginário popular, deixaram de ser um conteúdo underground da Internet para se tornar conhecido nas principais plataformas de streaming, na Netflix já tem vários dublados, tanto do Japão, quando da China e Coreia do Sul. E preciso falar das músicas que as animações trazem nas aberturas e encerramentos? Eu fiz um texto sobre elas há um ano atrás (leia aqui) e falo do quanto de cultura que elas agregam, eu posso falar por mim, tenho centenas de músicas japonesas por conta das aberturas e encerramentos que os animes nos mostraram, e aposto que você provavelmente tem uma aí no seu celular ou computador. Se você de repente parou pra ver a sua lista de músicas e se perguntou do porquê de ter tantas músicas do Japão, agora você sabe de onde veio tudo isto. E foi genial a maneira deles disseminarem sua cultura em nosso meio, pensa só que numa única abertura de anime, como a primeira abertura de Kaguya-sama: Love is War¸ ela trouxe uma música fenomenal de Masayuki Suzuki, que por conta disto sozinho, já te apresentou a um novo estilo de música, um novo artista, e por conta da música, site de letras e músicas cifradas, disponibilizam para nós a letra e os acordes, fora os covers como este sensacional do Miura Jam (abaixo).

E já entro em outro detalhe, os conteúdos gerados pelos fãs derivados por conta disto são vários, procure sites como o DeviantArt, e veja quantas artes gráficas baseadas em animes existem por aí. A cultura asiática foi vendida pra cá com esta genialidade, agregando tudo dela nos animes, filmes, doramas e séries, desde a música utilizada nessas obras, até o grafismo usado nos traços e artes. Muitos falam dos muitos episódios de praia, festival escolar, Bon Odori, mas pouquíssimos percebem a sacada genial que eles promovem, eles vendem pra você aquilo que eles são e tem, ou você acha que pessoas consideram veementemente se mudar pra Ásia do nada? Claro que não. Eu posso falar de experiência própria, quando nipônicos natos me contaram sobre tudo isso, me disseram que eles estão surpresos que nós gostamos do conteúdo que eles fazem, por quê? Pois estes conteúdos são bem “japoneses”, ou seja, a maneira com que transmitem sua estória, a estética, a personalidade, a linguagem e a maneira como se comunicam, são todas feitas para os próprios japoneses, mas que permeabilizaram bem em nossa cultura. Eles vendem estes produtos envelopados de maneira ímpar, ao passo que você consuma este produto com tudo aquilo que representa a cultura deles, logo, você estará ouvindo suas músicas, comendo suas iguarias, e compreendendo sua arte, coisa que os conteúdos do Ocidente deixaram a tempos de fazer.

A Face da Avalanche

Gotoubun no Hanayome
©Gotoubun no Hanayome

Se pormos isto em perspectiva objetiva, a real é que os asiáticos vieram com o mesmo conteúdo que já tínhamos aqui, filmes, séries, documentários, jogos, animações, mangás e manhwas, as contrapartidas das HQ’s na Ásia. A pergunta é, como eles começaram a dominar o mercado? Simples, continuaram a fazer o que já fazem desde a primeira animação adaptada de mangá, Astro Boy. Eles fizeram uma fórmula que é basicamente infinita, ao adaptar uma obra escrita em um conteúdo audiovisual e vice versa, eles ajudam a tornar a obra escrita mais conhecida para todos, já que em alguns casos mundo à fora, é mais fácil algo chegar primeiro por vídeo do que por impressão ou mesmo por acesso na Internet, logo, todo o conteúdo da obra se torna mais conhecido pelos fãs. Hoje mesmo, começaram a expandir o negócio em várias áreas, como os jogos, vários são os jogos que expandem ou complementam melhor a estória das animações, que ao fazerem isto, conquistam fãs de diferentes áreas para a sua obra, pegue por exemplo Konosuba, o anime azarão de 2016 que surpreendeu a todos na época, lançou jogos em plataformas diferentes, como em Konosuba: Fantastic Days, que para além da sua animação, convidou a turma dos jogos para conhecer a obra, e diferente das visual novels, não são fechadas no nicho, e acabam por atrair mais pessoas. E qual animação ocidental vem fazendo isso? Nenhuma!

Konosuba: Fantastic Days
©Konosuba: Fantastic Days

Se o exemplo dos jogos não lhe agradou, vamos para um ainda mais visível; se eu te perguntar o nome de duas animações japonesas de esportes e duas americanas ou europeias, quais você responderia hoje de bate pronto sem pesquisar? Eu tenho aqui em mãos o mangá de Haikyuu que ganhei outro dia da turma da Anime United, que também tem uma animação, inclusive tem um texto do meu amigo Welerson aqui no site sobre o mangá (leia aqui), e tem Blue Lock lançado recentemente com texto da minha amiga Bolinho de Arroz (leia aqui), mas não lembro de um único deste canto do mundo. Se formos mais a fundo, quantas animações o Japão sozinho lançou em 2022? Pelo que pude apurar (leia aqui), 285 animes foram lançados, de animações originais até continuações, e se compararmos com o que fora lançado pelo Ocidente, até parece covardia, pois os EUA, Canadá, Europa e até mesmo o nosso Brasil, juntos lançaram apenas 111 animações (leia aqui), e nem queira saber quantas destas não são CGI e/ou voltadas especificamente para o público infantil, pois seria ainda pior.

Haikyuu
©Haikyuu

Não precisa ser um gênio pra ver o quanto que as obras orientais obliteram em termos de visibilidade, basta abrir a Netflix ou Prime Video pra se ter uma ideia do quanto as animações do Ocidente perderam relevância, a última que acompanhei vinda dos states foi a adaptação em animação do jogo de Cuphead, que vale trazer uma análise dele aqui em breve, de resto? Praticamente tudo nulo. Muito por conta da pouca exposição e expansão que as obras daqui tem, além do quê, as animações daqui giram em torno das obras originais, e se tiver uma época ruim de criatividade? Só lamento! Veja a Cartoon Network do começo dos anos 2000 e compare-a com a de hoje, chega a ser depressivo ver que tínhamos obras das mais variadas, como A vida e as Aventuras de Juniper Lee, quem não lembra da Te Xuan Ze? Ou Meu Amigo da Escola É Um Macaco? KND: A Turma do Bairro, HI-Hi Puffy AmiYumi, Megas XLR, As Meninas Superpoderosas, enfim, a lista simplesmente é longa o suficiente para eu escrever um texto só das animações da CN, vocês entenderam o ponto, e hoje não restou nada.

Cuphead
©Cuphead

É mais prático adaptar de jogos ou mangás, do que criar do zero, tanto que as animações originais do Japão existem, mas sempre são bem poucas e variadas, mas só isto não explica a quantidade, pois basta ver que a Warner Bros, que é a dona do CN, lançou absurdos 1,041 curtas do famoso Merrie Melodies, que farei um texto logo, e hoje a CN estica a aberração de Jovens Titãs em Ação até não poder mais, adivinhem quem deu mais dinheiro e audiência? O que ajuda a contribuir com esta decadência do cenário de animação ocidental, pois perdemos algo que os asiáticos nunca abriram mão, a VARIEDADE. Eu pego o exemplo que eu pude passar para vocês, se eu pegar as últimas quatro Primeiras Impressões que fiz para o site, eu trouxe The Marginal Service (leia aqui) que é uma obra original de pura ação envolvendo ET’s, uma mistura boa de Esquadrão Classe A e MIB, Blue Orchestra (leia aqui) que aborda um cenário musical na escola, Edens Zero (leia aqui) que é aquela mistura que todo fã de anime de verdade curte, ação, ecchi, comédia na medida certa, e Tengoku Daimakyou (leia aqui) com um cenário apocalíptico e de pressão psicológica. Não consigo ver contrapartes para concorrerem com os japoneses, pense em um gênero artístico e com quase 100% de certeza, eles têm e nós não, e sem esta variedade se torna impossível encarar de igual para igual contra o que os asiáticos estão apresentando.

Quando se morde a mão que te alimenta…

Lightyear
©Lightyear

Se já não basta os asiáticos estarem pulverizando a concorrência ocidental, e olho nas animações chinesas e sul-coreanas, elas estarão chegando por aqui muito em breve, já acompanho algumas que tem uma qualidade de animação absurda de tão boa, está havendo um processo de reformulação na mentalidade das grandes produtoras de Hollywood que vem causando uma quebradeira sem precedentes na história, nunca se viu tantos fracassos de bilheteria nos cinemas, e até mesmo acesso nas plataformas de streaming, como se está vendo nos dias de hoje. E em quase todos, sempre falhando com o mesmo erro, quase como se fosse feito de propósito, com aquilo que falei no começo do texto, as obras daqui viraram palanques político-sociais para pessoas com mentalidade fechada, quer um exemplo? Pois então, Lightyear foi a aposta da nostalgia da Disney pra fazer dinheiro rápido, e flopou. O filme teve um orçamento e 200 milhões de dólares, e lucrou 226,4 milhões de bilheteria, mas Josué, tiveram lucro de 26 milhões, como que flopou? Simples, lembre-se que há custos com propaganda a nível global, e propaganda não é algo barato e fácil de ser feita, fora outros gastos e ainda a receita dos cinemas que fica para si, e dados mostram que a obra teve um déficit de 106 milhões de dólares, para uma empresa que acumula fracassos nos últimos anos.

Lightyear
©Lightyear

A obra não teve posição de fato, segundo a proposta, o filme é o mesmo que Andy viu e virou fã, mas a Disney esqueceu que já tinha feito uma animação chamada Comando Estelar com este propósito. Mas o que fez o filme flopar, foi o panfletarismo com a cena de um mero segundo com duas mulheres, destacaram tanto que a animação feita para CRIANÇAS teria um beijo lésbico, que isto sozinho já desanimou a grande parcela do público, e não por conta do beijo, e pelo o que ele de fato representa, além de esquecerem do resto do enredo ruim do filme. A ironia foi a seguinte, chamaram a todos os que não gostaram do filme de “homofóbicos”, e ironizaram as pessoas que não gostaram do filme por cona só dessa cena, e ainda esperavam cativar o público assim? PARA BÉNS, continuem assim e verão o fundo do poço chegar para vocês, o curioso é que essa turma do cancelamento que está à frente de Hollywood hoje, NUNCA MENCIONA OS YURIS/YAOIS, o problema não foi a homofobia mítica que eles pensam, estão usando este público como meio, e nada mais. Mais engraçado é que quando obras convencionais, como One Piece, One Punch Man, Sailor Moon, tem personagens homossexuais, o que a mídia ocidental faz? Das duas, uma: ou jogam para debaixo do tapete e ignoram totalmente, ou usam de maneira xexelenta para seu panfletarismo identitário, e advinha? Não cola!

One Piece
©One Piece

Os asiáticos fazem algo que prezo, usam os personagens da maneira como melhor convém, sejam eles quais forem, pode ser branco ou preto, alto ou baixo, gordo ou magro, homem ou mulher, criança ou idoso, eles não destacam um detalhe ou outro da pessoa, eles contam estórias envolvendo as personas da maneira como melhor convir ao autor, assim como uma banquinha na feira que vende pastel, ela não está enfiando o pastel goela abaixo do cliente, ela está lá para o cliente que quer de fato consumir deste produto, e é mais outro detalhe que simplesmente encontrou bom gosto no nosso paladar. A verdade é que pessoas racionais não curtem nada forçado, novamente, olhemos para o passado e vejamos as tantas animações da CN, Nicklodeon, Disney, que simplesmente permearam no imaginário do público, lembro bem até hoje dos Castores Pirados, Projeto Zeta, Catdog, propostas tão variadas e que são lembradas por aí até hoje, mas nada forçado como as animações chochas que temos por aí, como Steven Universe, Hora de Aventura, Gumball, e outras porcarias que não colam, não tem o mesmo sucesso, e tomam lavadas todos os dias dos animes. Quando você olha pra produtoras poderosas como a Disney, e vê que elas estão comprando animes japoneses a toque de caixa, você percebe que a coisa está preta para o lado deles, que um dos primeiros estúdios de animação está dependendo de animes japoneses para impulsionar sua plataforma, só penso que Walter Elias Disney deve estar se revirando no caixão com isto.

Há uma luz no fim do túnel

Mushoku Tensei
©Mushoku Tensei

Eu vejo que até há uma solução para o problema crônico que as animações do Ocidente criaram para si, estou vendo uma adaptação de uma webtoon independente que um grupo americano está fazendo pelo próprio esforço e por financiamento direto de fãs, chamado Lackadaisy, já há uma prévia de meia hora do filme, e está divino! (veja ele aqui) Não estou exagerando, a qualidade gráfica é algo que estúdios consagrados por aí não estão entregando, e a estória adaptada é diferenciada, praticamente ilhada nos EUA, o que por si só já acaba sendo um atrativo, mas mostra algo que minha entrevistada, Aloubell, disse no ano passado (veja aqui), ela disse que “há bibliotecas cheias de potencial inexplorado”, e de fato há uma gama enorme de conteúdos que não são explorados por ninguém por aí, como Lackadaisy, e como eu tinha dito anteriormente, é mais simples adaptar uma obra do que fazer uma do zero, e se pararem de ficar moendo o bagaço dessa cana e começarem a ir para novas, de certo alcançarão em quantidade aos asiáticos, este é o primeiro problema para resolverem. O segundo problema a ser resolvido é começarem a variar, eu amo o gênero de heróis, mas ficar batendo somente nessa tecla é um saco, comecem a variar nas propostas e nos gêneros, pois assim o alcance cultural também aumenta.

Lackadaisy
©Lackadaisy

O terceiro e último problema, PAREM DE PANFLETARISMO BARATO, parece até a figura da pessoa querendo ser aceita, mas que não aceita os outros, o público cansou de terem suas obras travestidas de identitarianismo e corrompidas com tanto anacronismo, comecem a aceitar o fato de que a vasta maioria do público não gosta de ver seu personagem favorito ter sua estória alterada para agradar a 0.6% de gatos pingados do Twitter, contem estórias interessantes sem ficar destacando um detalhe do personagem só pra gerar alvoroço, aliás, querer gerar conversa por polêmica é tão amador, que não me impressiona que obras como High Guardian Spice fracassaram e viraram chacota, JÁ SATUROU. Se não corrigirem estes problemas, para além dos japoneses, chineses e sul-coreanos, eles terão de se preocupar com a implosão que ocorrerá se mudanças drásticas não ocorrerem, os de fora sabemos quando se movimentam, o problema é quando as atitudes surgem de dentro. Lembro-vos do que levou o fim dos Merrie Melodies, demoraram na transição dos cinemas para a televisão, e sim, os curtas da Warner eram transmitidos nos cinemas, a Disney foi mais rápida em adaptar o formato de rolos para cinema para os de televisão, e quando a Warner o fez, a audiência não decolou e outros já tinham assumido o mercado, como a Hanna-Barbera que dominou o mercado nos anos 70, chegando a ter 70% do bolo no ramo de animações, e agora em 2023 vemos um cenário parecido, o mercado andou e o Ocidente ficou no passado, há chances de um 180° como a própria Warner nos anos 90? Sim, mas ou é feito, ou desta vez, não haverá volta.

Warner Bros/Merrie Melodies
©Warner Bros/Merrie Melodies

Considerações Finais

Por isto a mídia está desesperada em cancelar o Oriente e seus conteúdos, os asiáticos continuaram a serem quem são e tendo pontuais e assertivas adaptações ao longo dos anos para terem os conteúdos da maneira como conhecemos hoje, para mudar se é necessário muita energia e recursos, que as vezes a janela para isto ocorrer já se fechou. Eles são variados no que apresentam, quer ver uma disputa na cozinha? Veja Food Wars. Quer uma disputa valendo a vida? Tower of God é a animação certa para você. Eles querem apresentar estórias novas, e dar tempo para contá-las aos outros, sem interferência de grupos sociais. Eles mostram o que o público deles de fato quer ver, estão cag4nd0 e andando para o povo do politicamente correto, se querem ecchi? Ecchi eles te dão. Querem gore e um conteúdo mais crú e visceral? Eles te dão. Que as produtoras daqui aprendam com eles e que façam um conteúdo que de fato possamos nos relacionar e chamar de nosso!


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